terça-feira, 17 de junho de 2014

"Oliverrá" marcou época de êxodo de maranhenses para futebol da Bélgica

Oliveira em ação pela Bélgica: apesar da idolatria no país europeu, ele foi mal em 1998

Quando o atual técnico da Bélgica vestia a camisa 7 em sua terceira Copa do Mundo – em 1998 na França -, a principal atração do time era um negro, de cabelos com trancinhas e que chamavam de “Oliverrá”. Aírton Luís Oliveira Barroso era o camisa 8 e um ídolo dos belgas na ocasião, que não foi muito feliz. Com uma campanha ruim, o time belga se despediu do Mundial sem nenhuma vitória e sem o brilho de um jogador que abriu mão da nacionalidade brasileira e abriu as portas de uma rota de êxodo de jogadores maranhenses para a Bélgica.

Se hoje, os belgas celebram a maior seleção de sua história – embora o próprio Wilmots, que marcou dois gols em 1998 e três em 2002 -, na época havia talentos escassos. O meia Scifo e o goleiraço Preud'homme, expoente daquele time que foi eliminado pela Argentina de Maradona em 1986 e terminou na quarta posição – a melhor posição da história belga -, eram veteranos numa equipe burocrática e bem diferente do jogo mais leve e de bola no chão de hoje.

Atacante de velocidade, Oliveira jogava pelos lados do campo. O maranhense saiu em 1985 de São Luís para Bruxelas - Oliveira teria seguido o caminho o atacante Serjão, ex-Moto Clube, que inaugurou a rota Maranhão-Bélgica. Foi descoberto por um empresário argentino chamado José Rubilota quando atuava pelo Tupi numa partida contra o Moto Clube. Ele teria oferecido US$ 300 para levar o garoto, que estava completando 17 anos para o Anderlecht. Oliveira, antes, pelo Sporting de Lisboa, que tinha parceria com o clube belga. Demorou a fazer sucesso, mas depois levou da capital maranhense o irmão José Ribamar, na época com 19 anos, para os juniores de sua equipe, mais o amigo José Nilto – este para um time da terceira divisão.

A “ponte” Maranhão-Bruxelas atraiu muitos jovens menores de idade para a capital da Bélgica e para clubes menores. Raimundinho Lopes foi um deles. Hoje apresentador de TV em São Luís, ele defendeu o Seraing, que estava na terceira divisão em 1990 e chegou à primeira em 1993, quando ele resolveu voltar para seu país. Ele lembra que Oliveira era um ídolo no país.

- Era um dos melhores jogadores do Anderlecht. Tanto é que se naturalizou – recorda o jogador, que é pai de Flavio Lopes, meia-atacante ex-Cruzeiro, que hoje atua fora do país.

Atraídos por um país rico, que ainda hoje tem um dos melhores índices de qualidade de vida do mundo, os jovens jogadores sonhavam com a melhoria de vida e também com dinheiro para ajudar a família. Para isso, se preciso, adulteravam documentos e mentiam a idade. Na Bélgica da época, o jogador com menos de 17 anos não ocupava a vaga de um jogador estrangeiro.

 A imprensa do Brasil descobria "Oliverrá" oito anos antes dele jogar a Copa pela Bélgica

- Tinha muito menor de idade que saía do Maranhão e de todo lugar do Brasil nessa época. O jogador não faz por maldade, é uma maneira de ter uma condição de vida melhor. Num dia ele está morando numa palafita, no outro dentro de um palácio – diz Raimundinho, que também chegou a intermediar saídas de jovens revelações maranhenses para a Bélgica.

Por pouco um dos jogadores que se tornaria em pouco tempo grande destaque do futebol brasileiro não seguiu o mesmo caminho. Dener, falecido em 1994, esteve com um pé para viajar para a Bélgica com o amigo e atacante Sinval. A conexão era feita pelo pai de um jogador que havia ido para a Bélgica e descobrira um grande filão para jovens jogadores brasileiros.

- Esse pai do Alex, um atacante que jogava com a gente, oferecia uma grana, algo em torno de US$ 5 mil dólares e atraía todo mundo. Eu lembro que ele assediava os garotos num campo do lado do Corinthians, no Parque do Piquiri. Se alguém se destacava, ele chamava para ir embora. De futebol de salão, então, ele levou mais ainda. Mas o refúgio desse cara que se tornou empresário e de outros era o Maranhão, onde era mais barato e mais fácil de levar jogador, ainda mais trocando identidade – lembra o atacante Sinval.

Se nunca foi um craque, Oliveira se destacou na Europa. Depois do Anderlecht teve carreira longa na Itália, onde chegou a jogar com Edmundo na Fiorentina em 1998 – o ex-craque do Vasco comentou à época que o maranhense mal conseguia falar português. Oliveira jogou até depois dos 40 anos nas divisões inferiores da Itália. O pai dele, ex-jogador também – o ponta-direita Zezico -, faleceu em 2012 de câncer. O brasileiro belga chegou a levá-lo para fazer tratamento em Bruxelas, mas não houve melhora no quadro clínico.

Em 1990, em entrevista ao jornal O Globo, ele já falava da sua disposição de se naturalizar belga para ter chances de jogar na seleção do país europeu. Nem mesmo quando soube que Falcão, então técnico do selecionado brasileiro, o observava e elogiava ele parecia convencido a defender seu país de origem.

- Já vi jogador participar de um ou dois jogos na seleção e depois sumir. Tenho medo de acontecer isso – dizia na matéria publicada em dezembro de 1990.

Mais tarde, convocado para a Copa de 1998, o jogador admitia em outra publicação na imprensa brasileira que não teria chances na seleção. E olha que na época seu passe estava avaliado em US$ 10 milhões.

- No Brasil, mesmo se tivesse destaque, não teria a menor chance na seleção – afirmara ao Jornal do Brasil na Copa da França.

A mãe de Oliveira, dona Regina, ainda vive no Maranhão. O ex-jogador e o irmão moram em Bruxelas, na capital da Bélgica.

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